# 97 José Teixeira
Nome: José Teixeira
Naturalidade: Arouca
Idade: 43
Formação académica: Doutorado (2007-2011) e Mestre (2004-2006) em Geociências pela Universidade de Aveiro. Pós-Graduado em Sistemas de Informação Geográfica (2005-2006) e Licenciado em Geografia (ramo científico; 1998-2003) pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto.
Ocupação Profissional: Professor Auxiliar na Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Outros:
1- Quem é a/o Geógrafo/a? Em que áreas trabalha e de que forma a Geografia faz parte da sua vida?
José Teixeira. Licenciado em Geografia (ramo científico) e pós-graduado em Sistemas de Informação Geográfica pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto; mestre e doutorado em Geociências pela Universidade de Aveiro. Desde 2015, professor Auxiliar na FLUP e Investigador do Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT).
Tem como domínios de especialização a Geomorfologia aplicada, Geomorfologia regional, a Cartografia Aplicada/SIG aplicado à Geomorfologia, as Geociências e a Hidrologia. Tem como principais interesses de investigação a Geomorfologia, a Hidrogeomorfologia e Recursos Hídricos Subterrâneos, a Cartografia aplicada e as Tecnologias SIG. Nas instituições em que colaborou (FLUP, ISEP-IPP e UA) esteve envolvido ativamente em projetos ligados à geomorfologia aplicada aos recursos naturais e engenharia, cartografia geomorfológica e recursos hídricos subterrâneos.
Desde o final da licenciatura e início da minha vida profissional que não me lembro de nenhum trabalho em que a geografia não estivesse presente. Fosse uma prestação de serviços, um relatório técnico, um artigo ou um projeto científico, a geografia esteve sempre presente: no trabalho de campo e na recolha de dados, no tratamento e análise espacial desses dados, na produção cartográfica ou nas análises/textos produzidos, e na atividade docente na FLUP, como não poderia deixar de ser…
2- Quais são os projetos para o futuro imediato? E de que forma valorizam a Geografia?
Neste momento, tenho em mãos vários projetos/desafios, de que destaco dois. Estou a preparar a submissão de um projeto de investigação ligado ao inventário e gestão sustentável de recursos hídricos. Trata-se de um tema importante, atual e de elevada relevância social. A geografia e as tecnologias SIG serão uma base fundamental neste projeto.
O segundo desafio está ligado às minhas recentes funções de diretor do Mestrado em SIG e Ordenamento do Território (MSIGOT). Num mundo em rápida mudança, é essencial acompanhar as transformações tecnológicas, dando resposta aos novos desafios territoriais que vão surgindo (ex. mudanças climáticas, crescimento urbano, …). Nesta área, o mercado de trabalho apresenta-se muito dinâmico e cada vez mais exigente ao nível dos conhecimentos e competências exigidas aos nossos diplomados. É uma tarefa constante responder a estas mudanças (ajustando os conteúdos e estratégias de ensino-aprendizagem, por exemplo), tentando preparar da melhor forma os nossos estudantes para as exigências atuais e futuras do mercado de trabalho.
3- Se tivesse de definir Geografia em 3 palavras, quais escolhia?
Eu escolheria os contextos: o Contexto Físico – onde se incluem as características ambientais e os processos atuantes em aspetos como o relevo, o clima, os solos e os organismos; o Contexto Humano/Cultural – onde se incluem os aspetos relacionados com a população, a agricultura, os transportes, a indústria, as cidades/ urbanização, o turismo, bem como as atividades políticas, culturais e sociais; o Contexto Temporal – quer as atividades humanas, quer os processos físicos, ocorrem ao longo de um determinado tempo, que importa estudar.
Apenas uma visão integrada destes contextos (espaciais e temporais) nos fornecem uma compreensão abrangente dos problemas geográficos.
4 - Comentário a um livro que o marcou ou cuja leitura recomende.
Permitam-me que recomende dois, e complemente um deles com um filme:
- A Formação de Portugal, de Orlando Ribeiro (Letra Livre, 2023). É a reedição recente da obra com o mesmo nome publicada em 1987 pelo ICALP. Pela sua abordagem interdisciplinar, é um livro essencial a qualquer geógrafo. O livro aborda temas como o território, a tradição cultural pré-histórica, a romanização, a herança dos Mouros, as reconquistas, a génese de Portugal, a organização do país, a fronteira e a língua. O livro inclui um conjunto de textos complementares que visam contribuir para uma melhor compreensão das origens de Portugal e do povo português. Ler os textos do Prof. Orlando Ribeiro é sempre um prazer. Mais ainda quando a obra tem uma excelente apresentação do meu colega e amigo João Carlos Garcia.
- Atlas Suzanne Daveau, com organização de Duarte Belo e Madalena Vidigal (ed. Museu da Paisagem, 2021). O livro começa com a história de Suzanne Daveau em Paris em 1925, onde tirou as suas primeiras fotografias. O livro apresenta dezenas de fotografias da sua autoria, compondo um extraordinário álbum de uma vida. Complementaria o livro com o documentário “Suzanne Daveau”, de Luísa Homem (2022), que retrata a sua história de vida, desde os seus tempos de estudante em Paris, ao trabalho de campo em África e Portugal, até às suas reflexões sobre modernidade.
5 - Que significado e que relevância tem, no que fez e no que faz, assim como no dia-a-dia, ser geógrafo?
Recém-licenciado em Geografia, ingressei num mestrado em Geociências na Universidade de Aveiro em 2004. Nessa altura, os SIG iniciavam uma fase de franco desenvolvimento. Começavam a entrar no nosso vocabulário termos como geodatabases ou WEBSIG. O meu gosto pelas tecnologias já vinha de trás, e nessa altura percebi que seria uma boa aposta a formação na área dos SIG. Assim, durante o ano em que estava a escrever a dissertação, decidi então voltar à FLUP e frequentar a então Pós-graduação em SIG (no seu segundo ano de funcionamento; posteriormente daria origem ao atual mestrado em SIG e OT). Foi um ano intenso, mas que me deu competências essenciais na área do SIG para a minha prática profissional futura.
Entre 2006 e 2015, além de bolseiro de doutoramento FCT, colaborei numa série de projetos de investigação, prestações de serviço, estudos de impacte ambiental (ex. Barragem de Foz-Tua) e outros serviços de consultoria para diversas empresas, sempre com equipas multidisciplinares. A Geografia, e em especial os SIG, foram fundamentais no desenvolvimento de todos esses trabalhos, e em todos eles a minha perspetiva geográfica foi uma mais-valia.
A partir de 2015, com a minha entrada na FLUP, o tipo de trabalho que desenvolvia mudou um pouco, mas a importância da Geografia na minha vida acabou por se reforçar. Considero que um bom professor universitário deve ser também um bom investigador. A investigação em geografia é um trabalho estimulante, e que nos permite a produção de conhecimento, bem como a projeção nacional e internacional individual e das instituições em que estamos integrados. Mas permitem também melhorar a nossa qualidade e práticas pedagógicas, estimulando a curiosidade, autonomia e espírito crítico dos nossos estudantes. É um privilégio poder ensinar Geografia. Gosto especialmente do trabalho de campo e de dinamizar saídas de estudo com os estudantes. O campo é a melhor sala de aula de um geógrafo.
6 - Na interação que estabelece com parceiros no exercício da sua atividade, é reconhecida a sua formação em Geografia? De que forma e como se expressa esse reconhecimento?
Certamente que sim. Desde o início da minha carreira que estive integrado em equipas multidisciplinares, quer em ambiente académico, quer em ambiente empresarial. Além de geógrafos, trabalhei (e trabalho atualmente) com geólogos, biólogos, engenheiros geotécnicos, engenheiros civis, engenheiros do ambiente, arquitetos, arqueólogos, ... Num ou outro caso foi necessário um pouco de esforço, fazendo notar à equipa a importância de uma boa cartografia ou da perspetiva geográfica. Mas na maioria dos casos, tal nem era necessário.
Atualmente, não noto qualquer falta de reconhecimento, bem pelo contrário. Sou muitas vezes procurado por colegas de outras áreas, apelando à minha visão geográfica e competências de cartografia/SIG.
7 - O que diria a um jovem à entrada da universidade a propósito da formação universitária em Geografia, sobre as perspetivas para um geógrafo na sociedade do futuro? E a um geógrafo a propósito das perspetivas, responsabilidades e oportunidades?
A um jovem que inicia a sua jornada universitária, diria que a formação que está prestes a adquirir é uma ferramenta poderosa. Não apenas abre portas para uma variedade de carreiras, mas também fornece uma lente através da qual podemos entender o mundo complexo em que vivemos. Estudar geografia, especializando-se depois no mestrado, pode abrir portas a uma série de oportunidades profissionais.
No sector privado, as empresas valorizam cada vez mais os geógrafos pelas suas competências em análise espacial e compreensão dos padrões ambientais e sociais. Os geógrafos podem trabalhar em planeamento urbano, gestão de recursos naturais, logística, ou até mesmo em marketing, onde a compreensão da distribuição geográfica dos consumidores pode ser crucial.
No sector público, os geógrafos são frequentemente empregados em departamentos de planeamento e desenvolvimento, agências ambientais e de transporte, e em instituições de investigação. Eles ajudam a moldar políticas públicas, gerir e proteger os nossos recursos naturais, e planear as nossas cidades e infraestruturas de transporte.
No ensino básico e secundário, os geógrafos desempenham um papel vital na educação das gerações futuras, ensinando aos alunos sobre o mundo físico e humano ao seu redor.
Mas além dessas saídas profissionais, a formação universitária também lhes fornece uma compreensão mais profunda das múltiplas facetas do nosso mundo - ambientais, sociais, económicas, culturais e políticas. Este conhecimento geográfico é uma ferramenta poderosa. O que cada um decide fazer com esse conhecimento depende das suas próprias paixões, valores e das oportunidades que lhe são apresentadas. Mas uma coisa é certa: a formação universitária providencia as ferramentas para fazer a diferença, seja qual for o caminho escolhido.
8 - Comente um acontecimento recente, ou um tema atual (nacional ou internacional), tendo em conta em particular a sua perspetiva e análise como geógrafo.
Nos tempos conturbados em que vivemos, não podia deixar de fazer referência às guerras. No entanto, gostaria de focar esta minha análise nos conflitos relacionados com a água.
Apesar da sua enorme disponibilidade no planeta, a água com características apropriadas para consumo humano é muito escassa. De toda a água existente no planeta, mais de 99% é salgada e encontra-se nos oceanos, ou está armazenada nas calotes polares e glaciares e, portanto, não é utilizável para consumo humano. Assim, a água doce utilizável representa apenas cerca 0,6% de toda a água do nosso planeta. Aliada a esta escassez, a sua distribuição geográfica é desigual. Como tal, este recurso é fonte de enormes conflitos que já remontam ao tempo dos Sumérios (cerca de 2500 anos A.C.), prolongando-se até aos dias de hoje.
O Pacific Institute mantém uma base de dados (https://www.worldwater.org/conflict/map/) com mais de 1600 casos de conflitos relacionados com a água entre 2500 a.C. e 2023 d.C. Os conflitos variam desde disputas entre comunidades e países pelo acesso a recursos hídricos, até aos ataques a barragens, sistemas de irrigação e fornecimentos de água durante tempos de guerra, tais como os que aconteceram em várias barragens e sistemas de abastecimento de cidades ucranianas. Muitos dos conflitos são atribuídos a fatores como seca, crescimento populacional e migrações, que aumentam a pressão sobre fontes de água escassas. Alguns outros exemplos incluem disputas entre antigas cidades-estado sumérias, conflitos entre Israel e seus vizinhos sobre desvios de água do rio Jordão ou mesmo protestos e distúrbios mais recentes em áreas que enfrentam escassez de água.
A água é, cada vez mais, um importante elemento geoestratégico e geopolítico. A visão da geografia poderá ser uma mais-valia na sua gestão, que em muitos destes casos exige uma concertação internacional.
9 - Que lugar recomenda para saída de campo em Portugal? Porquê?
Sendo natural de Arouca, não poderia deixar de indicar o Arouca Geopark. O Arouca Geopark possui 41 geossítios de relevância internacional. Recomendo a visita à Serra da Freita, nomeadamente às Pedras Parideiras – fenómeno geológico único no mundo – e à Frecha da Mizarela – a maior queda de água em Portugal Continental, com mais de 60 metros. No outro lado do concelho, as deslumbrantes paisagens do Rio Paiva e os passadiços convidam também a uma visita. A ponte suspensa 516Arouca, com um comprimento de 516 metros e uma altura de 175 metros acima do rio Paiva, oferece uma experiência emocionante e uma vista panorâmica deslumbrante a quem não tiver medo de alturas.
Para recuperar energias, nada melhor que degustar alguns dos pratos da excelente gastronomia local: a vitela ou o cabrito assado no forno, a posta Arouquesa na brasa ou os bifes de Alvarenga. Para finalizar, nada melhor que provar os doces conventuais, feitos à base de amêndoa, açúcar e ovos: as castanhas doces, as roscas e os charutos de amêndoa, as barrigas de freira ou as morcelas doces.