# 105 Ana Sofia de Sousa

Nome: Ana Sofia Bandovas Parreira de Sousa
Naturalidade: Évora
Idade: 43
Formação académica: Licenciatura em Geografia – Planeamento e Gestão do Território
Ocupação Profissional: Técnica Superior na CCDR do Alentejo (Unidade de Ordenamento do Território)

1- Quem é a/o Geógrafo/a? Em que áreas trabalha e de que forma a Geografia faz parte da sua vida?
Desde que terminei a minha licenciatura em 2003, fui tendo o privilégio de ter a Geografia sempre presente na minha vida, em diferentes níveis e natureza de funções.
No âmbito profissional, prestei pontualmente serviços no âmbito dos sistemas de informação geográfica (no setor privado) e estive um ano a trabalhar na ex-DGOTDU (atualmente Direção-Geral do Território), ao abrigo do Programa de Estágios na Administração Pública. No entanto, foi na administração local que percorri a maior parte da minha carreira profissional até agora, trabalhando durante 14 anos como geógrafa no Município de Estremoz (a minha terra). Como eu costumo dizer, é neste nível de intervenção que conhecemos a realidade do território em maior profundidade, estamos mais próximos das preocupações, problemas e expectativas da população. Deparamo-nos com o desafio permanente de garantir o equilíbrio entre aquilo que cremos ser as melhores soluções para o ordenamento do território e um planeamento participativo e integrado, no qual todos se revejam. Por outro lado, os municípios do interior do país dispõem ainda de parcos recursos no que respeita a quadros técnicos, e o geógrafo acaba por desenvolver tarefas transversais aos diversos setores de atuação municipal, o que nos obriga a um estudo e atualização constantes, mas que também nos enriquece do ponto de vista da experiência e do conhecimento prático.
Em 2021, surgiu a oportunidade de ingressar na CCDR do Alentejo, onde exerço atualmente funções como técnica superior, na Unidade de Ordenamento do Território, especificamente na Divisão de Ordenamento e Gestão Territorial. O nível de atuação regional é, sem dúvida, aquele que mais me fascina, na medida em que a adoção de boas políticas públicas, programas e instrumentos num nível regional se afiguram indispensáveis ao desenvolvimento e à coesão dos territórios. 
Na minha vida pessoal, o “olhar” da Geografia também acaba por estar presente no meu quotidiano, pois não é possível dissociar os papéis. A observação dos lugares, das dinâmicas territoriais, das questões demográficas acompanha-me invariavelmente a cada sítio onde vou, é um exercício em permanência.

2- Quais são os projetos para o futuro imediato? E de que forma valorizam a Geografia?
A CCDR do Alentejo está neste momento a preparar a revisão do Programa Regional de Ordenamento do Território, sendo este um instrumento primordial na definição da estratégia regional de desenvolvimento territorial, ao assumir um “papel de charneira” entre os objetivos e diretrizes da política nacional e os objetivos de política territorial de nível regional, constituindo o quadro de referência para o desenvolvimento dos planos de âmbito municipal. 
Assim, no âmbito da competências da unidade que integro, irei acompanhar os trabalhos e, por isso, terei a oportunidade de dar o meu contributo, como geógrafa, quer ao nível do diagnóstico prospetivo, quer ao nível da definição das opções estratégicas de base territorial e normas orientadoras, reconhecendo, nesta matéria, a preponderância de um diagnóstico rigoroso e ajustado à realidade territorial para o sucesso da proposta, sem descurar, naturalmente, o envolvimento e a participação dos diversos stakeholders que operam neste território.

3- Se tivesse de definir Geografia em 3 palavras, quais escolhia?
As três primeiras palavras que me ocorrem são Território, Sustentabilidade e Equidade. A primeira representa o objeto essencial da Geografia, enquanto ciência que estuda a interação entre os fenómenos físicos e sociais. As outras duas – sustentabilidade e equidade – constituem, em última análise, os objetivos que subjazem à aplicação desta disciplina nas diferentes áreas de atuação.

4 - Comentário a um livro que o marcou ou cuja leitura recomende.
Poderia citar aqui alguns “clássicos” da nossa Geografia portuguesa (“Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico”, do Professor Orlando Ribeiro, ou “A Área de Influência de Évora. Sistema de Funções e Lugares Centrais”, do Professor Jorge Gaspar). No entanto, atendendo à pertinência e controvérsia que o tema tem suscitado ao longo de décadas, recomendo a leitura do livro “(Re)visitar a Regionalização 25 anos depois”. Trata-se de uma compilação de textos de 14 autores (com a coordenação de André Carmo, Conceição Rego, Manuel Courdet Branco e Maria da Saudade Baltazar) que apresenta diversas perspetivas sobre a temática da regionalização, do ponto de vista teórico e académico, convidando-nos à reflexão e ao debate de ideias sobre os prós e contras inerentes a uma nova organização político-administrativa do território português. Não se trata, portanto, de um livro “contra” ou “a favor” da regionalização, mas sim de um conjunto de textos, escritos de forma bastante objetiva e esclarecedora, que nos resumem os contornos de um eventual processo de regionalização e as suas implicações políticas, sociais e económicas e que nos podem auxiliar numa tomada de posição mais informada e consciente sobre este assunto.

5 - Que significado e que relevância tem, no que fez e no que faz, assim como no dia-a-dia, ser geógrafo?
Ao nível profissional, julgo que a perspetiva multidisciplinar e “macro” do geógrafo afigura-se como um fator positivo no exercício das minhas funções, na área do ordenamento do território. Para além disso, a licenciatura em Geografia tem uma componente prática (nomeadamente através de saídas de campo) que nos confere, entre outras competências, aptidão para a leitura do território, da paisagem, para a identificação dos pontos fortes e pontos fracos dos lugares, bem como a capacidade de aplicar diversos métodos e técnicas que nos permitem analisar e interpretar dados estatísticos, cartográficos, entre outros.
Também enquanto cidadã, considero que a perspetiva de geógrafa me ajuda a compreender melhor a realidade que nos rodeia, desde os assuntos que vão desde a geopolítica mundial, às transformações que vão ocorrendo no território às diferentes escalas (nacional, regional e local).

6 - Na interação que estabelece com parceiros no exercício da sua atividade, é reconhecida a sua formação em Geografia? De que forma e como se expressa esse reconhecimento?
Nesta matéria, creio que ainda temos um caminho considerável a percorrer até chegarmos ao (merecido) reconhecimento do papel preponderante do geógrafo, em vários domínios de atuação. A título de curiosidade, fui a primeira geógrafa a trabalhar no município de Estremoz e, nos primeiros tempos, tinha de explicar de forma pedagógica as funções que estamos habilitados a desempenhar, que vão muito para além do ensino da Geografia. Certo é que, atendendo à nossa polivalência e transversalidade de assuntos com os quais lidamos, a determinada altura somos requisitados para as mais variadas tarefas e o contributo do geógrafo passa a ser indispensável. No entanto, não são raras as vezes em que ainda sou chamada de “arquiteta” ou “engenheira”. É um processo de reconhecimento que vamos fazendo paulatinamente, mas creio que já conquistámos o nosso “espaço” no contexto de equipas técnicas multidisciplinares, nomeadamente quando se trata de elaboração de planos de ordenamento do território.

7 - O que diria a um jovem à entrada da universidade a propósito da formação universitária em Geografia, sobre as perspetivas para um geógrafo na sociedade do futuro? E a um geógrafo a propósito das perspetivas, responsabilidades e oportunidades?
Em primeiro lugar, diria que devemos confiar sempre na nossa intuição e seguir aquilo que nos entusiasma, que nos desperta curiosidade, sem estarmos exclusivamente focados nas saídas profissionais de determinado curso.
 A formação universitária em Geografia abre um leque de escolhas que vão desde o ensino, ao ordenamento do território, proteção civil, sistemas de informação geográfica, entre outras. No entanto, eu costumo dizer que a mais-valia que a licenciatura em Geografia me proporcionou foi a flexibilidade, a capacidade de lidar com assuntos diversos, embora isso implique a necessidade de um estudo permanente, a busca contínua por novos conhecimentos e a troca de ideias com colegas de outras áreas de formação. Portanto, quem deseja seguir a área de Geografia, deve estar preparado para estes desafios, que são ao mesmo tempo oportunidades de crescimento pessoal e profissional. Acima de tudo, diria que o mais importante é fazer aquilo que se gosta, com espírito de missão e sentido de compromisso no exercício da atividade, seja em que área for.

8 - Comente um acontecimento recente, ou um tema atual (nacional ou internacional), tendo em conta em particular a sua perspetiva e análise como geógrafo.
Atendendo à gravidade e magnitude do acontecimento, parece-me pertinente comentar a tragédia recente das cheias em Valência.
Como é sabido, a cidade de Valência tem sofrido, ao longo dos séculos, múltiplos episódios de precipitação extrema e inundações que provocaram danos humanos e materiais. Durante o período de governação do General Francisco Franco, foi levado a cabo um projeto ambicioso para a zona em causa, com o desvio do leito do Rio Túria para um canal artificial para sul da cidade. 
Contudo, o planeamento e a consequente ocupação do solo a sul da cidade não terá considerado os novos caudais de ponta e alcance das potenciais cheias que este desvio terá induzido para aquela área, verificando-se uma crescente impermeabilização, através da construção de edifícios, estradas e outras infraestruturas. Foi precisamente nas margens do rio canalizado que se registou, neste episódio, o maior número de vítimas e danos materiais.
Estas ocorrências alertam-nos para a necessidade de conferir cada vez maior rigor e exigência às políticas de ordenamento do Território, sobretudo num contexto de alterações climáticas, as quais, não sendo só por si o fator responsável por estes acontecimentos, fazem aumentar a frequência e a magnitude de eventos meteorológicos extremos, pelo que os territórios terão de estar mais preparados e ser mais resilientes para fazer face a esta realidade.

9 - Que lugar recomenda para saída de campo em Portugal? Porquê?
Poderia sugerir diversos lugares, mas por uma questão de afinidade, recomendo (como não poderia deixar de ser) uma saída de campo à denominada Zona dos Mármores, que corresponde ao triângulo Estremoz – Borba – Vila Viçosa. Trata-se de um território muito interessante, não só do ponto de vista “geológico” (devido à existência do anticlinal de Estremoz), mas também da perspetiva das atividades económicas em presença – extração e transformação do mármore. É sabida a importância deste tipo de atividades e do seu valor económico para a região, contudo, são evidentes os impactos ambientais e paisagísticos negativos que têm resultado da exploração intensiva deste recurso ao longo dos anos, nomeadamente na proliferação de escombreiras. Nesse sentido, poderá ser lançado o desafio aos alunos que reflitam sobre novas formas de abordagem destes espaços (muitos deles já abandonados e sem exploração ativa), numa perspetiva da sua requalificação e reutilização para outras valências (turísticas, culturais, de recreio e lazer, entre outras).